
A EUCARISTIA
(Para uma melhor compreensão)
Considere-se a Eucaristia como uma das incumbências mais importantes da vida religiosa do cristão e do Povo de Deus.
Já no princípio do Cristianismo a reunião eucarística teve frequência semanal. Foi ela que deu ao primeiro dia da semana o nome de “Dia do Senhor”.
Os Atos dos Apóstolos, cap.2, informam-nos que, logo no início, a primeira comunidade de Jerusalém se reunia, e “eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à reunião fraterna, à fração do pão e às orações”. É o que ainda hoje se faz na celebração da Eucaristia.
A importância radical desta, ressalta da forma como Jesus, primeiro a anunciou e, depois, a instituiu ou “criou”.
O anúncio encontra-se no cap.6 do Evangelho de São João. Nesse capítulo Cristo disse que ia dar um Pão do Céu que era a sua carne, verdadeira comida, e o seu sangue, verdadeira bebida (vs.51). “Se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós” (vs.53). “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue, permanece em Mim e Eu nele” (vs.56).
O facto aconteceu na “Última Ceia”, que foi o encontro mais profundo e último de Cristo com os seus Apóstolos. Aí Ele “criou”, isto é, instituiu a Eucaristia e mandou que a celebrassem em sua memória, e em continuação do que Ele fez.
A instituição da Eucaristia foi narrada por São Mateus cap. 25, vers.26-28, por São Marcos 14, 22-24 e por São Lucas 22, 19-20. São João não a narrou porque os outros Evangelhos já o tinham feito. Mas contou o anúncio dela nas profundas expressões daquele cap.6.
Da conjugação das três narrações resultam as palavras que a Igreja usa na celebração da Eucaristia: “Tomai e comei todos, isto é o meu corpo que será entregue por vós! “Tomai e bebei todos: este é o cálice do meu sangue, da Nova e Eterna Aliança, que será derramado por vós e por todos para remissão dos pecados. Fazei isto em memória de Mim”.
Por volta do ano 56, São Paulo na sua 1ª Carta aos Coríntios, cap.11, dá instruções para que a celebração decorra com equilíbrio, e entende-se que ela era frequente em Corinto, como em todas as Igrejas.
A vida cristã das pessoas e das comunidades, alimenta-se na Eucaristia, mas na atualidade tem havido uma decadência enorme dessas vidas como tem havido uma grande decadência na sua participação. Por quê?
As razões são várias e têm a ver com os estilos de vida atual dos indivíduos, das famílias, das comunidades, e das sociedades dos nossos tempos. Mas parece que a principal razão será a falta de conhecimentos esclarecedores sobre a Eucaristia e as razões para celebrá-la. Por isso impõe-se, antes de tudo, captá-las. Depois impõe-se captar os problemas que afastam da sua prática. São razões geralmente incompletas e superficiais.
Temos, assim, os seguintes pontos:
- Conhecimentos básicos e esclarecedores sobre a Eucaristia
- As verdadeiras razões de a celebrar
- Razões incompletas de participar
- As raízes da ligação à Eucaristia
- Reações de agressividade
- Alguns mal-entendidos:
- Dos que participam
- Dos que não participam
- A boa vontade
- Conhecimentos básicos e esclarecedores sobre a Eucaristia
O fato fundamental aconteceu na Última Ceia.
A Eucaristia tem três grandes dimensões: a celebração do Sacrifício de Cristo, a Comunhão do Corpo do Senhor e a Presença Real, isto é, o Santíssimo Sacramento. A mais básica e raiz de todas é o Sacrifício.
A celebração consiste em realizar o que Cristo instituiu na Última Ceia, e que aconteceu na Cruz.
Estando à mesa reunido com os seus discípulos Ele tomou o pão, partiu-o e deu-lho dizendo: tomai todos e comei: “isto é o meu corpo que será entregue por vós”. Depois tomou o cálice e deu-lho dizendo: “tomai todos e bebei. Este é o cálice do meu sangue, da nova e eterna aliança que será derramado por vós e por todos para remissão dos pecados – fazei isto em memória de mim”.
Como dito, Ele tinha anunciado que daria a sua carne como verdadeira comida, e o seu sangue como verdadeira bebida. Muitos tinham-se chocado com essas palavras, porque as achavam duras. E até O abandonaram porque elas eram misteriosas.
Mas na Última Ceia Ele revelou o enigma: o pão e o vinho seriam transformados no seu Corpo e Sangue.
O que se passou nessa ocasião, e que se passa nas nossas celebrações, é o sacrifício do Corpo e Sangue do Senhor. Dele vêm as hóstias consagradas que se recebem na comunhão e se guardam nos sacrários das nossas igrejas. É o Santíssimo Sacramento, isto é, ”o verdadeiro Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo” que nós adoramos.
Ao captar este acontecimento de Cristo na Última Ceia, encontram-se as razões fundamentais de celebrar a Eucaristia. Estas razões são muito pouco conhecidas e ficam bastante incompletas nas consciências de muitas pessoas.
- Verdadeiras razões de celebrar a Eucaristia
Entre as razões fortes de participar na Eucaristia convém salientar seis. As duas primeiras são fundamentais porque resultam diretamente do projeto de Cristo. As outras quatro brotam dos grandes factos que têm lugar no “mistério” da Eucaristia e na celebração.
1º O projeto de Cristo – Quando Cristo disse: “fazei isto em memória de mim”, encarregou o seu Povo da celebração da Eucaristia, associando-o à salvação dos homens. Ele é o Filho de Deus feito homem e tem toda a autoridade divina. Se nos diz para fazermos o que Ele fez, devemos ser fiéis ao seu projeto e tomar parte na celebração. É uma questão de consciência.
2º Por vós e por todos – Na Cruz Ele ofereceu o sacrifício da sua vida por todos os homens. Na Última Ceia instituiu uma continuação desse sacrifício e encarregou a sua Igreja de o renovar e manter. Ele ficou a cargo de todos nós. Mas Cristo disse: “Por Vós e por todos para remissão dos pecados”.
Remissão é ser-se liberto de qualquer negatividade. Pecado é tudo o que for negativo e tiver necessidade de melhorar. A remissão dos pecados foi o primeiro objetivo da vida e morte de Cristo. Pela celebração da Eucaristia Ele ligou-nos à tarefa de redimir toda a humanidade. Celebrando-a estamos a colaborar com Ele pata o bem de todos.
Se não tomamos parte, estamos a privar os outros da nossa ajuda. É uma espécie de tradição.
3º Reunião e Aliança – Ele disse: Sangue da Nova e Eterna Aliança. Aliança é a ligação de Deus com os homens, destes com Deus, e de uns com os outros.
No início da celebração, nós dizemos: “bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo”: Na Eucaristia estamos reunidos como Povo de Deus. Ele disse: “quando dois ou mais se reunirem em meu nome, Eu estarei no meio deles”.
A celebração estimula e alimenta em nós o encontro da família com Cristo e com o seu Povo. Mesmo que não se conheça a linguagem ali falada, estamos a celebrar com eles. Quem não participa vai ficando longe, esquece-se de Deus, ausenta-se de Cristo e dos Irmãos; fica pobre, religiosamente inculto e amortecido. A reunião e a palavra são acontecimentos de família, espiritualmente educativos.
4º Convivência da Palavra – Participar na Missa inclui “ouvir” a Palavra de Deus. Mas é mais do que isso. É vivê-la e convivê-la com Cristo, com o divino e com os irmãos.
Na Missa, a Palavra não se encontra só nas leituras e na pregação. Ela é “falada” do princípio até ao fim; – são invocações e cânticos, orações e salmos, responsórios e admonições (orientações), convites e recitações, antífonas e doxologias (expressões de louvor).
A palavra une-nos com Deus, estimula os pensamentos e orienta as consciências para Cristo. Ela ilumina a celebração e faz com que todos e cada um convivam o espírito do cristianismo. É uma formação contínua e fonte de energia espiritual.
5º Convivência na Oração – Cristo rezou muito e mandou-nos rezar. Ele falou da oração individual “no nosso aposento”, e da oração em comunidade: “se dois de entre vós se unirem, na terra, para pedirem qualquer coisa, obtê-la-ão de Meu Pai que está nos Céus. Pois onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estarei no meio deles” (S. Mateus, cap,18 vs.19).
Na celebração da Eucaristia convive-se de formas variadas. Muitas vezes a assembleia é convidada à oração: “Oremos”; outras vezes diz-se “Amén”: “Assim seja”. Reza-se o “Pai-Nosso”, oração por excelência, ensinada pelo próprio Cristo.
Duma maneira geral fala-se com Deus, em linguagem de louvor, de pedido e de ação de graças. Isto acontece, muito em particular, nas várias “Orações Eucarísticas”, que são textos muito ricos situados na celebração entre o “Santo, Santo” e o Pai-Nosso. Cada uma delas é “Palavra de Deus”, especialmente na consagração.
Na “oração dos fiéis” encontram-se temas importantes da oração comunitária.
6º A comunhão – A comunhão eucarística consiste em receber o Corpo do Senhor: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna e eu ressuscitá-lo-ei no último dia” (S.João, 6.54).
Se alguém não está em condições espirituais de comungar, não deve afastar-se da celebração pois a “comunhão espiritual” encerra incalculáveis valores. Ela consiste no desejo sincero de receber o Senhor e também é uma forma de encontro íntimo com Ele.
- Razões incompletas de participar na Eucaristia
Mas, sendo tudo tão claro a partir da Última Ceia, é notável o que se passa com muitas pessoas em relação à Missa. Tanto os que participam como os que não participam, mostram não conhecer as verdadeiras razões da participação.
Uns e outros costumam apresentar motivos que, na verdade não valem, porque são superficiais, subjetivos, acidentais, às vezes infantis e até erróneos.
Em regra, os que participam, mesmo com boas intenções e com sinceridade, dão motivos frágeis e periféricos, geralmente alheios ao que Cristo disse e ao valor real da Eucaristia. Não são motivos enraizados em Cristo nem nas necessidades dos homens.
Os que mais se ouvem são: vou à missa para ouvir a Palavra de Deus, porque se não for não é Domingo, porque sou obrigado, porque gosto, porque me sinto bem, porque me dá paz, porque gosto da missa em tal igreja, dita por tal padre … etc.
Estas e outras razões semelhantes, significam uma falta de compromisso real com Cristo e com os homens. Porque são frágeis podem desfazer-se como o fumo, ao passo que a importância da Eucaristia não desaparece.
- Assim, a palavra de Deus é importante, mas, em si mesma, a celebração é independente dela. Se eu estiver num ambiente cuja língua não conheço, estou da mesma forma “convocado” por Cristo para participar. Com a minha presença sincera, tomo parte no acontecimento da Última Ceia.
- Vou porque sou obrigado? A obrigação pode ser tomada como escravatura, e é pena que tal aconteça com a Missa. Mas, mesmo assim, é melhor participar do que não participar. Para a pessoa verdadeiramente amadurecida, ela não significa imposição da parte de ninguém. É simplesmente uma atitude de consciência que resulta do projeto de Cristo, e da sua importância para os homens. Se vejo o valor e o significado da Eucaristia, a minha consciência manda-me participar, eu obedeço à sua voz, e sinto-me sinceramente “obrigado”, mas faço-o com dedicação, boa vontade e sentido do divino.
- “Se não for à missa não é domingo”? Trata-se duma vivência sincera, pois o Domingo é dia da Eucaristia e da comunidade. Porém, se eu deixar de ir cinco ou seis Domingos, deixo de ter aquela vivência, e já nem penso que é Domingo. E passo seguidamente a não sentir a sua falta. Compreende-se que a razão fundamental deve ser a palavra de Cristo: “fazei isto em minha memória… por vós e por todos…”
- Vou porque gosto? É bom gostar, mas o gosto pode desaparecer. Porém, se eu conhecer as verdadeiras razões, continuo a ir da mesma forma. Vou porque é necessário. E ainda posso vir a criar amor e gostar.
A nossa principal razão de fazer qualquer coisa deve estar na necessidade -eu faço porque é necessário. E geralmente o gosto vem acompanhar o que se faz.
- Vou porque me sinto bem, por que me dá paz? É a mesma situação. Posso nem sempre encontrar a paz. Mas continua a ser necessário, para mim e para os outros, participar na Eucaristia. “Por vós e por todos”…
- O mesmo se diga acerca de gostar da Missa em tal igreja, celebrada por tal padre. São factores positivos. Mas podem tornar-se negativos se me afastam e me tornam incapaz de participar numa celebração qualquer. O que interessa é a celebração.
- Raízes infantis da ligação à Eucaristia
No fundo de todos os problemas está a falta das raízes infantis de ligação a Cristo e à Eucaristia.
As pessoas não costumam dar conta de que os nossos “amores” pela vida fora, têm a sua raiz nos primeiros anos de existência. É neles que nós nos contagiamos, ou não nos contagiamos, seja com o que for.
Tomemos dois exemplos muito simples: o insucesso escolar e a preguiça das novas gerações. Quase todos os bebés e crianças de hoje são criados sem contacto com o gosto pelo trabalho. Pelo contrário são “embalados” em atmosferas de nada apreciar, de nada fazer, excepto brincar, e não se importar com nada. Faltam-lhes ligações ao que é sério e necessário.
Com a religião dá-se o mesmo facto. Actualmente os bebés e crianças são privados de experiências de ligação com o Cristianismo, a começar pela Eucaristia, pela oração na infância, e pelo conhecimento de Cristo. Por isso não têm nenhuma ligação com Ele. Por quê?
Está no fundo um problema de base psicológica de aprendizagem e de estabelecimento de ligações e de “amores”. É um facto psicológico que é a partir do nascimento que se estabelecem as principais ligações afectivas. Os veículos dessas ligações são os contactos com as pessoas e as suas vivências. E quase simultaneamente o contacto com os factos e com as coisas. Estes contactos geram o chamado “contágio de emoções” que consta precisamente das ligações afectivas e das aquisições de traços de personalidade, de gostos e de maneiras de ser.
O assunto seria um tanto longo para se expor convenientemente. Mas basta olhar algumas situações. Se os bebés e crianças contactarem afectivamente com pessoas que gostam de trabalhar e com os seus trabalhos, vão ser trabalhadores. Ao contrário, se estes contactos não se derem, eles serão preguiçosos; se forem inteligentes, eles serão inteligentes; se forem de amizade, eles serão amigos, etc. Esta foi a experiência de muitos séculos, a qual se interrompeu nas últimas décadas por várias condições de vida. No fundo é a falta de contactos contagiantes com os pais e adultos.
É de notar-se o que se passa quando os bebés e crianças tomam parte nos acontecimentos adultos, como sejam festas, convivências e trabalhos. Eles ligam-se a esses acontecimentos. Por outro lado, se não se habituarem a tomar parte neles, não se ligam e ficam-lhes estranhos. É o que se verifica com muitas crianças e jovens de hoje que formam “outra” sociedade, distante dos adultos, e têm outros gostos.
Foi exactamente o que se passou e se passa com a religião. A experiência de muitos séculos demonstra que há três pistas essenciais destes contágios de infância:
- Os bebés e crianças, participarem na celebração, desde que nascem. Para nós, católicos, é a celebração da Eucaristia.
- Desde os dois anos e meio, contar-lhes histórias de Cristo.
- Desde essa data rezar com eles.
- Os bebés na Missa
A experiência, hoje ainda seguida nalguns lugares, demonstra que os bebés e crianças que, desde que nascem, tomam parte nas celebrações, mantêm na vida adulta uma “fidelidade” mais segura às atitudes religiosas. Por quê?
Porque a presença deles na celebração fá-los viver um contacto especialmente calmo e íntimo com os adultos; e, ao mesmo tempo, com o ambiente de silêncio, de oração, de canto e de companhia. Como regra eles não criam problemas e sentem-se bem na celebração.
Se pelo contrário, começarem mais tarde, costumam criar complicações nas primeiras cinco ou seis vezes. É que eles não estão habituados àquele ambiente.
2. As “histórias de Cristo”
Hoje toda a gente sabe que, a partir dos dois e meio – três anos, as crianças “adoram” histórias. Estas contribuem para modelar as suas personalidades.
O que muitos não notam é que, para elas, é essencial alguém ler-lhas ou contar-lhas. Isto é tão significativo que as próprias crianças “obrigam” as pessoas a contar-lhes a mesma história “milhentas” vezes. O interesse está não tanto na história, como no “prazer” da convivência com a pessoa que a narra. A narração é forma íntima de conversa. O segredo está em que essa prática é essencial para estabelecer as tais ligações e “amores” do futuro. As histórias e o contacto com quem as conta, funcionam como factores de contágio e socialização.
Neste campo, as pessoas não costumam dar conta do problema dos “macaquinhos” ou banda desenhada na TV. Eles não falam com as crianças.
Daí uma das razões porque tantas delas, hoje, são “ausentes”, não ouvem, não falam com os adultos, não ligam, não se interessam por nada deles. E não têm verdadeiro amor.
Quanto às “histórias” de Cristo, estas despertam-lhes interesse, como quaisquer outras. O que importa é que lhas contem.
Actualmente esta tarefa está facilitada porque há muitas Bíblias em histórias, e adaptadas às idades das crianças. Uma das melhores é “As 366 Histórias da Bíblia”. Trata-se dum livro bom para oferta de nascimentos, baptizados, aniversários, Natal, etc. E são muitos os adultos que apreciam a sua leitura porque a percebem melhor do que a própria Bíblia.
3. As orações
Por esta mesma idade as crianças gostam muito das chamadas “lengalengas”. Trata-se de palavras e frases organizadas em ritmos, e recitadas em grupo. A sua função também é de “convivência”, e de contágio. Ela estabelece ligações e “amores”.
Pois bem, as orações têm estrutura e funções de lengalengas. E têm o mesmo efeito de convivência, não só com as pessoas, mas também com o divino. Pelos três anos é tempo óptimo de começar a rezar com elas, naturalmente a partir de pequenas orações. Pelos quatro — cinco, já devem saber o Pai Nosso. Vêm seguidamente a Avé-Maria, o Glória ao Pai, a Salvé Rainha e outras orações populares.
- Reacções de agressividade
Os condicionamentos de falta de contágio levam igualmente à agressividade. Esta também é ensinada pelos adultos por meio de actuações violentas. E ainda, muito mais “facilmente”, por maneiras de pensar agressivas, seja contra o que for. É o caso das atitudes contra a religião, contra as autoridades, contra os companheiros de trabalho, etc.
A agressividade consiste em formas várias de “estar contra”. Pode ser activa quando há actuações “contra”, ou passiva quando não há actuações dessas. Há simplesmente o não aderir, não fazer, não ligar…
A agressividade passiva revela-se em muitos casos de estudantes que simplesmente não estudam, não ligam às aulas, nem ao que os adultos lhes dizem. Em muitos casos ela toma a forma de indiferença.
Perante a Eucaristia, há muitas atitudes de agressividade, quer activa quer passiva. É o que se nota em frequentes situações de mal-entendidos.
- Alguns mal-entendidos
a) dos que vão à missa
Mal-entendidos são maneiras não correctas ou até erradas de entender qualquer coisa. Acerca da Eucaristia, como já foi dito, eles resultam da falta de conhecimento do que ela é no pensar de Cristo, e das verdadeiras razões de participar.
Alguns desses mal-entendidos são comuns às pessoas que participam na Eucaristia e às que não participam. Geralmente tomam a forma de queixas, às vezes de acusações.
Uma série dessas queixas, que são muito variadas, diz respeito às maneiras de “fazer” as celebrações: é uma seca, é tudo muito monótono, não atrai ninguém, devia haver mais animação, outras músicas, conjuntos, missas de jovens, etc.
Concorda-se que há sempre algumas possibilidades de melhorar as celebrações. Mas o problema está especialmente na nossa maneira de olhar a Eucaristia. Como acima ficou exposto há necessidade dum entendimento pessoal, activo e profundo. São as verdadeiras razões de a celebrar.
As queixas geralmente surgem da confusão de essência da celebração com a sua forma exterior, e o seu “estilo”.
Como em todas as coisas humanas, há formas de celebrações mais simples, digamos “pobres”, e formas mais vistosas, solenes ou até espectaculares.
Há muito quem pense que as “espectaculares”, vistosas, atraentes, são necessárias para “chamar” os participantes. Está aí um enorme mal-entendido.
É certo que em qualquer celebração humana, as formas “vistosas” e “atraentes”, têm o seu significado e interesse, mas só em circunstâncias especiais. Em acontecimentos normais, como a Eucaristia, elas não podem ser a razão principal de se participar. Seria tão enganoso como se alguém fosse visitar os pais por causa das festas que eles dessem.
A verdadeira atracção deve resultar daquilo que é a Eucaristia em si mesma. Neste contexto as missas “pobres” são as de teor mais normal.
Entenda-se por Missa “pobre” uma missa sem “espectáculo”, celebrada com simplicidade por um sacerdote e participantes de forma humilde e modesta.
É uma Eucaristia espiritualmente valiosa. Nela participa-se em atitude de boa vontade, e em espírito de colaboração com Cristo, com a Igreja e com o Povo de Deus. Nela realiza-se a reunião fraterna com Deus por meio da presença dos participantes, dos diálogos, das respostas, das cerimónias conjuntas, da convivência, da palavra, da oração e da Comunhão eucarística.
Esta é em primeiro lugar a comunhão do Corpo do Senhor sob forma Sacramental. Mas também pode ser o simples desejo de O receber (comunhão espiritual).
Entre a Missa “espectáculo” e a Missa “pobre”, há a Missa que podemos chamar “de família dominical”. Será aquela em que a participação é mais notável, com a presença da comunidade, dos “animadores” de assembleia, das “orações dos fiéis”, do cântico, dos ofertórios e do “abraço da paz”.
Se a minha presença for motivada pelos elementos de espectáculo, eu estou ainda muito longe do pensamento de Cristo.
Se a “animação” estiver a cargo dum “grupo coral” ou duma “tuna de jovens” que cantam ou executam as “suas” músicas, caímos facilmente na missa “espectáculo”. Corre-se o perigo de ser-se “atraído” só por ele, e pouco ou nada mais. Com a continuidade, deixa de haver interesse.
A diferença está entre “participar” e “assistir”. Se eu participo, não sinto “seca”, não há monotonia, não há necessidade de ser atraído pelo espectáculo. Sou atraído pelo acontecimento de Cristo, pela minha união com Ele, e com o seu projecto. E também pela minha união com o seu e meu Povo, e com todos os homens. Tudo isto levado pela minha consciência e pela minha ligação a Cristo e à Eucaristia.
b) dos que não vão à Missa
A partir do que fica dito, pode entender-se o “Vazio” de ideias e a agressividade do que se ouve e das razões que se apresentam contra a Missa: “slogans”, frases feitas, expressões negativas, condenatórias, e frequentemente injustas…
No fundo, além dos mal-entendidos, costuma haver a já referida agressividade, e também desconhecimento mesmo em pessoas cultas. Ela costuma funcionar em sentido de crítica, com intermináveis repetições das mesmas ideias, sem qualquer espírito de busca ou esclarecimento.
– Não vou à Missa, porque não trago nada de lá! …
– Olha, estás comparável àqueles estudantes que vão às aulas e não trazem nada de lá. Falta a suficiente abertura de mente e a boa vontade para “captar”. Na base tens uma carência muito grande do conhecimento das razões da Missa.
– Não vou à Missa porque os que vão são os piores. Não me quero lá com aquela gente.
– Olha, Cristo disse: “Não julgueis para não serdes julgados … Quem não tiver pecados que atire a primeira pedra”. E o próprio Cristo nunca se afastou dos pecadores. Pelo contrário, procurava-os. A esse respeito pensa: serão mesmo os piores? Ele pronunciou uma parábola muito significativa: “o fariseu e o publicano”:
Os fariseus eram orgulhosos e às vezes o seu procedimento não era nada correcto. Os publicanos eram ladrões públicos e desprezados por toda a gente. Cristo contou a seguinte parábola: um fariseu e um publicano foram ao templo orar. O fariseu pôs-se lá adiante, de pé, e disse a Deus que não era como aquele publicano. O publicano ficou ao fundo, não se atrevia a levantar a cabeça, e pedia perdão a Deus. E saiu justificado. É terrível classificarmos os outros com os defeitos que nós possivelmente temos. E se não os temos, é sempre terrível condená-los e excluí-los. Ou excluirmo-nos a nós. Mais uma vez, Cristo andou com toda a espécie de pessoas. E, entre os próprios Apóstolos, havia alguns com notáveis defeitos.
Identificas-te com o publicano ou com o fariseu? …
– Não vou à Missa porque os que vão é só para mexericar: estão lá para ver como as pessoas estão vestidas e, mal saem, vêm a dizer mal de todos. Quando entra alguém na igreja, põem-se logo a olhar para trás.
– Repara, primeiro que tudo, não se vai, nem se deixa de ir à Missa por causa do que fazem as pessoas. Mais uma vez, vai-se por causa do projecto de Cristo: “fazei isto em memória de mim”, “por Vós e por todos para remissão dos pecados”.
Desculpar-se com os outros é uma falsa razão porque, mesmo que uma ou outra pessoa tenha grandes defeitos, olhe para trás, ou venha criticar, o normal dos participantes não o fazem.
E será mesmo verdade que vêm criticar cá para fora? Pode alguém criticar, mas são excepções. Se algum dia foste à Missa e vieste criticar, estás a pôr nos outros, aquilo que fazes de mal. Chama-se “transferência de responsabilidades”.
É negativo desculparmo-nos com o mal que inventamos para os outros. E se não foste lá, porque é que criticas?
– Não vou à Missa porque aquilo é uma “seca”.
– Olha, as coisas em si mesmas, não são “seca”. Eu é que faço delas uma “seca”, um aborrecimento, E faço a “seca” porque não compreendo, não sei valorizar, ou não tenho capacidade para isso.
Um exemplo. A matemática é lindíssima, importante e útil. Por causa dos “meus” problemas é que posso falhar nela. Eu é que faço a “seca”.
O mesmo se diga quanto à Missa. Por tudo o que fica dito até aqui, ela tem valores enormes e razões profundas para as nossas vidas. Para quem os capta, ela está longe de ser “seca”. Muito pelo contrário.
– Não vou à Missa porque não gosto daquele padre.
– Claro que há Sacerdotes mais atraentes do que outros. Nada impede que eu procure as Eucaristias em que eles celebram. Porém, na medida em que eu possuir as verdadeiras razões de participar, o tipo de sacerdote será cada vez mais secundário. Quando me desculpo com o padre, revelo no mínimo carências de relacionamento.
A celebração vale, não pelos níveis humanos, mas porque é o sacrifício do Corpo e do Sangue do Senhor. Ela não é do padre, embora este tenha uma função essencial. Até, pode participar-se em cheio na Eucaristia sem se ter contacto individual com ele.
O que ficou dito acima, acerca das maneiras de julgar os outros, aplica-se a qualquer pessoa nas mesmas circunstâncias.
– Sem ir à Missa também se pode ter religião.
– Sim, há muitos tipos e formas de religião, como os há de roupas, de comidas, de medicamentos, etc. Mas uns são de melhor categoria de que outros. Cristo é Deus e veio trazer esta forma de religião que é o Cristianismo. É a religião mais completa e o caminho apontado por Ele aos homens. A Eucaristia faz parte essencial do Cristianismo. Este será muito incompleto sem ela. Um Cristianismo sem Eucaristia é muito pobre. E mais pobre ainda se a minha não-participação for resultado de agressividades, más-vontades, orgulho, desprezo, ou superioridade”.
- A boa vontade
Como em muitos outros factos da vida humana, no fundo de todos estes problemas está a falta de boa vontade. Entenda-se por boa vontade a abertura mental para aceitar e ligar-se ao que está certo.
Ela implica um conjunto de atitudes intelectuais para “ver” o valor de qualquer realidade, e disposições para considerar esse valor, e tomá-lo a sério. Digamos, para dar conta dele, reconhecê-lo, apreciá-lo e, possivelmente, aderir-lhe.
A boa-vontade está presente, por exemplo, quando alguém lê um texto ou assiste a uma lição, e procura “aproveitar”. Ela faz a pessoa abrir-se para entender e assimilar o conhecimento. E além disso, ela exclui o desinteresse, a oposição e a crítica sistemática.
Quem possui boa-vontade não se regula por “ideias feitas” ou por slogans de teor negativo, mas procura valorizar e atingir o significado das ideias e dos factos.
Cristo foi a grande personagem da boa-vontade, e deu aceitação especial àqueles que a tinham. Mesmo que fossem pecadores. Em questões religiosas, às vezes chama-se-lhe “Coração Sincero”.
Capítulo do livro “Vias de Cristianismo Inteligente”
Autor: Caetano Tomás